domingo, 20 de dezembro de 2020

A educação por Agostinho da Silva.

 


É Realizações | Agostinho da Silva

O poder de esmagar de tal forma o que fora a Nação mais original do Ocidente e a de mais larga e profunda missão em todo o mundo [Portugal] só poderia ter sido dado à Europa por um grande acerto ou por uma grande tentação; (…) Essa tentação não podia ter deixado de ser a da eficiência, e a da eficiência vista não como serviço prestado aos outros, mas como uma afirmação da própria superioridade (…).

O golpe essencial a favor da eficiência tinha sido o de ver a sociedade como uma máquina de produção, em que cada qual tem de ocupar o seu lugar e de se desempenhar de suas tarefas com o máximo de obediência a uma organização central; para que isso se conseguisse tinham-se apurado as instituições estatais, eclesiásticas e escolares pondo-as, no máximo que era possível, ao serviço dos produtores. De todas elas, as que porventura tinham causado maior mal eram exactamente as escolares, porque a sua missão consistia em fazer durar o menos possível a criança, de modo a ter, para produzir, um maior número de adultos: é por isso que é inteiramente errado dizer-se que, na época de sua revolução industrial tinha a Inglaterra no serviço das minhas crianças de cinco anos; o que ela tinha trabalhando era uma coisa muito mais monstruosa: eram adultos de cinco anos de idade.
De então para diante em nada mais se mudou, na grande massa de educação, senão nas técnicas de fabricar adultos pelo assassínio das crianças; a humanidade de jeito ocidental pratica em grande escala o infanticídio de espírito, apenas o punindo quando é físico porque isso lhe rouba definitivamente a matéria prima do adulto. (…) diariamente as sacrificam nas nossas escolas, diariamente as crucificam, diariamente as imolam nas aras da Eficiência. (…)
Não haverá salvação para o mundo enquanto não entendermos e fizermos penetrar em nossas consciências este facto basilar, e enquanto as nossas escolas, transformando-se inteiramente, não forem, em lugar de máquinas de fabricar adultos, viveiros de conservar crianças; enquanto não forem as crianças que nos levem, não pelo caminho que uma ciência fáustica previu, mas pelo que houver, dando a mão, ao mesmo tempo, a nós e às coisas: enquanto não for o Menino Jesus nosso Deus verdadeiro. (…)
Pensam eles, os pobres, que pode jamais haver no mundo alguma forma satisfatória de governo organizado, de economia organizada ou de discurso do sobrenatural, a não ser que os pensemos sempre dentro de um mundo de adultos: fora dele, num universo de qualidades infantis, num Paraíso – e é por isso, porque os adultos aí eram crianças que não havia crianças com Adão e Eva, e só as houve depois que, para podermos comer e se vestir, principiaram eles a ser adultos, - num Paraíso, todo o governo que não for amar será absurdo, toda a economia que não for colher será absurda, toda a teologia que não for contemplar será absurda.
Agostinho da Silva
in «Um Fernando Pessoa»

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