segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Agostinho da Silva e os Partidos!!!

 

Agostinho da Silva – RTP Arquivos

"No partido, a intensa opinião se fragmenta e apuramos aquilo em que diferimos dos outros homens, não aquilo em que lhes somos irmãos; guiamo-nos por um ser geral que nos supera e por ele nos substituímos; vive em nós a tribo, muito mais do que a humanidade. Mas é num mundo de partidos que vivemos […]; não temos portanto outra possibilidade senão a de aceitar o jogo tal como ele se põe, exactamente como partimos de uma economia capitalista ou socialista para a economia da automação. O melhor será que não pertençamos a partido algum, porque a política não é uma essência de ser, como a religião, a ciência ou a arte, nas quais todos deveríamos estar: é uma pura fatalidade histórica, como a economia, ou a administração, como também a medicina ou a engenharia; que não pertençamos a nenhum dos partidos plurais e que não estejamos em nenhum partido único ou no seu, ou seus, contrários. A nossa acção, quanto a eles, tem de ser dupla: a de tentar que a cada momento, pelo que somos de capacidade de pensar libertos, influamos a sua liberdade, na sua largueza de entender e na sua generosidade de proceder; e a de, no momento de escolha, e no partido único a escolha é sempre abstenção, quer ela apareça ou não nos resultados oficiais, irmos por aquele que mais de acordo esteja com o que pensarmos e, sobretudo, com o que formos. Bom seria, por outro lado, que se defendesse o direito de se intervir na política, de se fazer política, sem pertencer a partido algum, criando-se condições eleitorais em que as máquinas partidárias não tivessem que entrar, nem se tivesse que pertencer ao governo para triunfar junto do povo. Uma política sem partidos, nem sequer o único, é a condição indispensável para que o Reino se instaure e para que, instaurado, seja. Acima de tudo, combatemos o que separa: e não são as opiniões individuais, mas as opiniões de grupo, o que realmente separa homem de homem; arregimentados, nos perderemos no melhor que temos: o ser irmão do mundo"
- Agostinho da Silva, “Ecúmena” [1964], in Textos e Ensaios Filosóficos II, pp. 199-200.

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