"Os incompetentes são sempre o maior número. E é esse maior número de incompetentes que tem de eleger, de descobrir as competências. Como há-de fazê-lo?
Para se adquirir uma competência determinada, foi preciso seguir um curso, realizar certos estudos, trabalhar durante longos anos. E quando se chega ao fim, aparece o voto anónimo e leviano dos incompetentes — e é esse que decide!
Com a sua vibrante lucidez, o sindicalista Georges Sorel definiu assim a Democracia, a ditadura da incapacidade.
Aceitemos a definição, e poderemos, alterando ligeiramente os termos, dizer: logo, a Democracia, suspensa dos juízos, sem preparação nem autoridade, do maior número — é o reino da Incompetência."
"Na política interna, a Democracia conduz à fraqueza. Dispersando a Autoridade, destrói-a. Dividindo ao máximo as responsabilidade, suprime-as na prática. Por isso, no momento do perigo, a Autoridade irresponsável da Democracia, sem força nem coerência, é incapaz de se opor à desordem.
Na política externa, a Democracia não se opõe também aos ataques ou ciladas do estrangeiro. Primeiro, porque a sua mitologia da Fraternidade a impede de acudir à defesa militar. Segundo, porque a tendência dos partidos de oposição e a missão dos agentes das sociedades secretas internacionais, são de favorecer às ocultas e até elogiar em público a intervenção estrangeira.
Temos a clara exemplificação destes pontos de vista:
— Quanto à política interna, na Democracia espanhola de 1931, em que os governos se viam reduzidos a assistir passivamente às greves, aos incêndios, aos massacres, às agitações de uma guerra civil cada vez mais feroz;
— Quanto à política externa, na atitude da Democracia francesa durante a Grande Guerra, entregando-se à Ditadura civil de Clémenceau, e às sucessivas ditaduras militares de Joffre, de Gallieni, de Foch — para resistir e vencer.
Logo, a Democracia, negação da Autoridade e da Responsabilidade — é incapaz de ser forte."
João Ameal
in «Integralismo Lusitano — Estudos Portugueses», 1932.
"Para serem legítimas as bases da Democracia, seria indispensável que existissem a Igualdade, a Liberdade, a Fraternidade, cuja célebre trilogia a Revolução Francesa escolheu para lema.
São os homens iguais? Ninguém ousará afirmá-lo. Uns, são mais fortes, mais trabalhadores, mais económicos, mais inteligentes que outros. Decretar a igualdade absoluta, é esquecer uma inflexível lei natural — que justifica as aspirações de todos os que se querem distinguir, conquistar um nome, uma fortuna, uma posição de comando.
Liberdade absoluta — não há, também, entre os homens. Presos às cadeias familiares, às dependências sociais, às regras morais que adoptaram, às carreiras que escolheram — os homens não são nunca inteiramente livres, nem podem sê-lo.
Quanto à Fraternidade, olhe-se a História, desde o início do mundo; descobre-se uma sucessão de lutas, de crimes, de conflitos... A Fraternidade é uma bela aspiração. Nada mais.
Logo, a Democracia, supondo a Igualdade, a Liberdade, a Fraternidade — é uma quimera."
"Para obter um simulacro de existência, a Democracia recorre à Eleição. Sabe-se bem o que é a Eleição. Nem vale a pena salientar os tumultos, os escândalos, as mistificações que nunca deixam de caracterizar a comédia eleitoral. Adiante, aludiremos ainda a um dos seus aspectos dominantes: a feira dos sufrágios.
Mas admitamos que se realize a Eleição com honestidade e verdade. No fim, é a maioria que manda. E basta uma diferença de um voto (que pode ser o de um malfeitor, o de um incapaz, ou o de um vendido) para que um sector prevaleça sobre o sector oposto. Portanto, se sessenta indivíduos têm uma opinião e sessenta indivíduos mais um têm a opinião contrária, são estes que vencem - e aqueles vêem-se esbulhados de tal soberania que, em princípio, fingiram dar-lhes.
A Democracia mostra assim merecer a justa definição de tirania em nome do algarismo, que lhe aplicou Alexandre Herculano. Não são as vontades individuais que lhe importam — embora o proclame; é apenas a soma dessas vontades. Ora, tão sagrada é a vontade de uma pessoa, como a vontade de dez pessoas, como a vontade de cem. Com que direito escravizar as duas primeiras à última?!
Logo, a Democracia, prometendo ao indivíduo uma soberania que só lhe reconhecerá, se ele se encontrar dentro da maioria e que lhe retirará, se ele se encontrar dentro da minoria — é uma mentira."
João Ameal
in «Integralismo Lusitano — Estudos Portugueses», 1932.
"A Democracia declara que o Poder reside na multidão. Formularemos, então, o seguinte dilema: ou a multidão é, ao mesmo tempo, governante e governada (e logo se vê que isto é contra a razão e totalmente impossível na prática) — ou a multidão delega o governo de qualquer maneira, indicando, ela própria, quem deve governá-la.
Mas, nesta segunda solução, encontra-se já a condenação da Democracia. A Democracia pura passa a não existir. O seu primeiro gesto é renegar-se a si mesma. Já não é a multidão, o povo, quem governa. «Nesse momento, pois, a soberania, deslocada do eleitorado para os seus representantes, sem possibilidade de uma fiscalização eficaz por parte daquele no seu modo de exercício, será assim, já não a vontade do povo — mas apenas a de uma aristocracia casual e momentaneamente constituída» — demonstrou, muito bem, o Professor da Universidade de Coimbra, Doutor Luís Cabral de Moncada.
A Soberania do Povo foi sempre um logro. Soberano — dizem-lhe — por intermédio dos seus delegados. Esses delegados, escolhidos nos centros partidários, não são mais do que agentes de certas facções, cujo fim determinante é o assalto ao Poder. E assim, em nome da soberania popular, tem lugar a mais hipócrita e astuciosa soberania dos partidos.
Nem admira. O ponto de partida, quimérico e perigoso, havia de produzir estas consequências...
Logo, a Democracia, baseando-se na atribuição do Poder à multidão, que nunca o chega a exercer de facto — é um contra-senso."
"Na verdade, o indivíduo — no sentido absoluto que os profetas revolucionários lhe deram — não existe. Pertence, sempre, a uma família, a uma profissão, a uma divisão do território — a um grupo natural ou social. Uma sociedade sem órgãos sociais é inconcebível. Ora, organizar uma sociedade é distribuir, dentro dela, as várias funções, os vários deveres, as várias tarefas. É, portanto, — hierarquizar.
O indivíduo — acentuamos de novo — socialmente, só existe como elemento daqueles órgãos de que a Sociedade se compõe. No seio do seu grupo, ao qual está ligado pelo sangue (família), pela formação técnica (profissão), pela naturalidade (região) — o indivíduo poderá viver, progredir, valorizar-se. Fora do grupo, é apenas um factor de desordem, uma figura inútil — uma ficção lamentável.
Logo, a Democracia, baseando-se no falso conceito do indivíduo-isolado — é uma utopia."
João Ameal
in «Integralismo Lusitano — Estudos Portugueses», 1932.
"Muitos dos grandes responsáveis dos tempos que correm, estonteados e desconcertados pelo ambiente da crise, de incerteza, de apreensão, mostram-se, de facto, incapazes de definir um pensamento claro e de manter uma linha de firmeza e de coerência. Fraquejam diante da tormenta que os cerca. Dia a dia, hora a hora, vemo-los oscilar, contradizer-se, desmentir-se. Não têm a coragem necessária para escapar à tirania de velhos mitos desacreditados, nem para traçar, entre os problemas e ameaças do momento o seu caminho. O drama europeu e universal a que assistimos resulta, sobretudo, dessa inferioridade dos grandes responsáveis: — competia-lhes impor-se aos acontecimentos e deixam-se afinal arrastar e dominar por eles..."
João Ameal
Nota:
João Ameal | |
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Nome completo | João Francisco de Barbosa Azevedo de Sande Aires de Campos |
Nascimento | 23 de fevereiro de 1902 Santa Cruz, Portugal |
Morte | 23 de setembro de 1982 (80 anos) Lisboa, Portugal |
Nacionalidade | Português |
Ocupação | Jornalista, escritor, politico, e historiador |
Magnum opus | Obreiros de Quatro Impérios |
João Francisco de Barbosa Azevedo de Sande Aires de Campos (Santa Cruz, Coimbra, 23 de fevereiro de 1902 — Lisboa, 23 de setembro de 1982), conhecido com o pseudónimo literário João Ameal, foi um jornalista, escritor, politico, e historiadorportuguês.
M BOM
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