quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Definição de uma democracia por João Ameal.


"Os incompetentes são sempre o maior número. E é esse maior número de incompetentes que tem de eleger, de descobrir as competências. Como há-de fazê-lo? 
Para se adquirir uma competência determinada, foi preciso seguir um curso, realizar certos estudos, trabalhar durante longos anos. E quando se chega ao fim, aparece o voto anónimo e leviano dos incompetentes — e é esse que decide!
Com a sua vibrante lucidez, o sindicalista Georges Sorel definiu assim a Democracia, a ditadura da incapacidade.
Aceitemos a definição, e poderemos, alterando ligeiramente os termos, dizer: logo, a Democracia, suspensa dos juízos, sem preparação nem autoridade, do maior número — é o reino da Incompetência."


"Na política interna, a Democracia conduz à fraqueza. Dispersando a Autoridade, destrói-a. Dividindo ao máximo as responsabilidade, suprime-as na prática. Por isso, no momento do perigo, a Autoridade irresponsável da Democracia, sem força nem coerência, é incapaz de se opor à desordem.
Na política externa, a Democracia não se opõe também aos ataques ou ciladas do estrangeiro. Primeiro, porque a sua mitologia da Fraternidade a impede de acudir à defesa militar. Segundo, porque a tendência dos partidos de oposição e a missão dos agentes das sociedades secretas internacionais, são de favorecer às ocultas e até elogiar em público a intervenção estrangeira.
Temos a clara exemplificação destes pontos de vista:
— Quanto à política interna, na Democracia espanhola de 1931, em que os governos se viam reduzidos a assistir passivamente às greves, aos incêndios, aos massacres, às agitações de uma guerra civil cada vez mais feroz;
— Quanto à política externa, na atitude da Democracia francesa durante a Grande Guerra, entregando-se à Ditadura civil de Clémenceau, e às sucessivas ditaduras militares de Joffre, de Gallieni, de Foch — para resistir e vencer.
Logo, a Democracia, negação da Autoridade e da Responsabilidade — é incapaz de ser forte."

João Ameal 
in «Integralismo Lusitano — Estudos Portugueses», 1932. 

Resultado de imagem para democracia portuguesa

"Para serem legítimas as bases da Democracia, seria indispensável que existissem a Igualdade, a Liberdade, a Fraternidade, cuja célebre trilogia a Revolução Francesa escolheu para lema.
São os homens iguais? Ninguém ousará afirmá-lo. Uns, são mais fortes, mais trabalhadores, mais económicos, mais inteligentes que outros. Decretar a igualdade absoluta, é esquecer uma inflexível lei natural — que justifica as aspirações de todos os que se querem distinguir, conquistar um nome, uma fortuna, uma posição de comando.
Liberdade absoluta — não há, também, entre os homens. Presos às cadeias familiares, às dependências sociais, às regras morais que adoptaram, às carreiras que escolheram — os homens não são nunca inteiramente livres, nem podem sê-lo.
Quanto à Fraternidade, olhe-se a História, desde o início do mundo; descobre-se uma sucessão de lutas, de crimes, de conflitos... A Fraternidade é uma bela aspiração. Nada mais.
Logo, a Democracia, supondo a Igualdade, a Liberdade, a Fraternidade — é uma quimera."



"Para obter um simulacro de existência, a Democracia recorre à Eleição. Sabe-se bem o que é a Eleição. Nem vale a pena salientar os tumultos, os escândalos, as mistificações que nunca deixam de caracterizar a comédia eleitoral. Adiante, aludiremos ainda a um dos seus aspectos dominantes: a feira dos sufrágios.
Mas admitamos que se realize a Eleição com honestidade e verdade. No fim, é a maioria que manda. E basta uma diferença de um voto (que pode ser o de um malfeitor, o de um incapaz, ou o de um vendido) para que um sector prevaleça sobre o sector oposto. Portanto, se sessenta indivíduos têm uma opinião e sessenta indivíduos mais um têm a opinião contrária, são estes que vencem - e aqueles vêem-se esbulhados de tal soberania que, em princípio, fingiram dar-lhes.
A Democracia mostra assim merecer a justa definição de tirania em nome do algarismo, que lhe aplicou Alexandre Herculano. Não são as vontades individuais que lhe importam — embora o proclame; é apenas a soma dessas vontades. Ora, tão sagrada é a vontade de uma pessoa, como a vontade de dez pessoas, como a vontade de cem. Com que direito escravizar as duas primeiras à última?!
Logo, a Democracia, prometendo ao indivíduo uma soberania que só lhe reconhecerá, se ele se encontrar dentro da maioria e que lhe retirará, se ele se encontrar dentro da minoria — é uma mentira."

João Ameal 
in «Integralismo Lusitano — Estudos Portugueses», 1932.

Resultado de imagem para democracia portuguesa

"A Democracia declara que o Poder reside na multidão. Formularemos, então, o seguinte dilema: ou a multidão é, ao mesmo tempo, governante e governada (e logo se vê que isto é contra a razão e totalmente impossível na prática) — ou a multidão delega o governo de qualquer maneira, indicando, ela própria, quem deve governá-la.
Mas, nesta segunda solução, encontra-se já a condenação da Democracia. A Democracia pura passa a não existir. O seu primeiro gesto é renegar-se a si mesma. Já não é a multidão, o povo, quem governa. «Nesse momento, pois, a soberania, deslocada do eleitorado para os seus representantes, sem possibilidade de uma fiscalização eficaz por parte daquele no seu modo de exercício, será assim, já não a vontade do povo  mas apenas a de uma aristocracia casual e momentaneamente constituída» — demonstrou, muito bem, o Professor da Universidade de Coimbra, Doutor Luís Cabral de Moncada.
A Soberania do Povo foi sempre um logro. Soberano — dizem-lhe — por intermédio dos seus delegados. Esses delegados, escolhidos nos centros partidários, não são mais do que agentes de certas facções, cujo fim determinante é o assalto ao Poder. E assim, em nome da soberania popular, tem lugar a mais hipócrita e astuciosa soberania dos partidos.
Nem admira. O ponto de partida, quimérico e perigoso, havia de produzir estas consequências...
Logo, a Democracia, baseando-se na atribuição do Poder à multidão, que nunca o chega a exercer de facto — é um contra-senso."



"Na verdade, o indivíduo — no sentido absoluto que os profetas revolucionários lhe deram — não existe. Pertence, sempre, a uma família, a uma profissão, a uma divisão do território — a um grupo natural ou social. Uma sociedade sem órgãos sociais é inconcebível. Ora, organizar uma sociedade é distribuir, dentro dela, as várias funções, os vários deveres, as várias tarefas. É, portanto, — hierarquizar.
O indivíduo — acentuamos de novo — socialmente, só existe como elemento daqueles órgãos de que a Sociedade se compõe. No seio do seu grupo, ao qual está ligado pelo sangue (família), pela formação técnica (profissão), pela naturalidade (região) — o indivíduo poderá viver, progredir, valorizar-se. Fora do grupo, é apenas um factor de desordem, uma figura inútil — uma ficção lamentável.
Logo, a Democracia, baseando-se no falso conceito do indivíduo-isolado — é uma utopia."

João Ameal 
in «Integralismo Lusitano — Estudos Portugueses», 1932.


Resultado de imagem para democracia portuguesa

"Muitos dos grandes responsáveis dos tempos que correm, estonteados e desconcertados pelo ambiente da crise, de incerteza, de apreensão, mostram-se, de facto, incapazes de definir um pensamento claro e de manter uma linha de firmeza e de coerência. Fraquejam diante da tormenta que os cerca. Dia a dia, hora a hora, vemo-los oscilar, contradizer-se, desmentir-se. Não têm a coragem necessária para escapar à tirania de velhos mitos desacreditados, nem para traçar, entre os problemas e ameaças do momento o seu caminho. O drama europeu e universal a que assistimos resulta, sobretudo, dessa inferioridade dos grandes responsáveis: — competia-lhes impor-se aos acontecimentos e deixam-se afinal arrastar e dominar por eles..." 

João Ameal

Nota:
João Ameal
Nome completoJoão Francisco de Barbosa Azevedo de Sande Aires de Campos
Nascimento23 de fevereiro de 1902
Santa CruzPortugal
Morte23 de setembro de 1982 (80 anos)
LisboaPortugal
NacionalidadePortugal Português
OcupaçãoJornalistaescritorpolitico, e historiador
Magnum opusObreiros de Quatro Impérios
João Francisco de Barbosa Azevedo de Sande Aires de Campos (Santa CruzCoimbra23 de fevereiro de 1902 — Lisboa23 de setembro de 1982), conhecido com o pseudónimo literário João Ameal, foi um jornalistaescritorpolitico, e historiadorportuguês.

1 comentário:

O Molusco...

Para bom entendedor... «(...) A ambiguidade da figura de Caetano, de acordo com o The New York Times, tinha ficado bem demonstrada na sua at...