João Branco Núncio, uma figura incontornável da nossa tauromaquia, um grande português, um grande empresário, um homem exemplar, um grande ser humano. Infelizmente morreu por um único motivo, a sede de destruição e o apagar de tudo aquilo que foi marcante e positivo que se fez no passado deste país até ao dia da fatídica e vergonhosa revolução.
"Dos muitos casos de violência, de roubo, de confisco da propriedade privada, ocorridos no Alentejo, alguns há que não podem ser facilmente esquecidos. Encontra-se nesta circunstância, o assalto à residência de mestre João Branco Núncio, já depois de lhe terem extorquido as suas bens exploradas empresas agrícolas e o seu semental de gado bravo. Dando vazão a ódios recalcados, a vinganças que se achavam adormecidas, manipulados politicamente, tomam-lhe alguns trabalhadores a casa de assalto, depradando-a pela forma mais selvática que se pode imaginar. A pretexto (aparece sempre um pretexto) da equívoca explosão de um engenho no Centro da Reforma Agrária, de Alcácer do Sal, indivíduos, na sua maioria estranhos à vila, para o efeito devidamente instrumentalizados, assaltam-lhe a residência particular, o que lhe restava, e à numerosa prole ainda a seu cargo. A pau e à navalha, destroem-lhe peças de mobiliário, o seu pequeno museu de recordações tauromáquicas, praticamente desfeito numa fúria selvagem, a que não foi poupado sequer um retrato a óleo, da autoria de Eduardo Malta, da figura em corpo inteiro do nosso maior mestre de toureio equestre de todos os tempos, o qual foi furiosamente golpeado à navalhada. A cabeça embalsamada do seu primeiro touro, como debutante, foi destruída à paulada, com ferocidade...
Praticamente sem recursos com que valer à família numerosa ainda a suas expensas - como era o caso do seu filho e jovem cavaleiro José Núncio, inválido, como se sabe, em consequência de grave queda quando montava a cavalo - mestre João fora de alongada até à Golegã, hospedando-se em casa de seu cunhado Patrício Cecílio. Das suas montadas, de alta escola e apuro, apenas uma lhe ficou. Com ela se estava treinando, na esperança moça dos seus mais de 70 anos de voltar aos redondéis e amealhar uns tostões para não morrer à míngua. No entanto, não resistiria à dolorosa situação em que se achava. Um colapso cardíaco, surpreende-o a viver essa fagueira esperança de um regresso que, por desígnio de Deus, não se viria a consumar. Ficou de mestre Núncio, um nome honrado, uma grande simpatia humana e uma saudade que o tempo jamais apagará. Morto pelo ódio e não pelo amor dos homens!"
João M. da Costa Figueira
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