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quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Democracia, a ditadura das multidões.

 

«O homem é naturalmente resignado. O homem moderno mais do que os outros, em consequência da extrema solidão que o mergulha uma sociedade que praticamente já não conhece entre as pessoas outras relações que não sejam as do dinheiro. Mas mal andaríamos se acreditássemos que essa resignação faz dele um animal inofensivo. Ela concentra no homem venenos que, chegando o momento, o tornam disponível para toda a espécie de violência. O povo das democracias não passa de uma multidão, uma multidão mantida na expectativa pelo Orador Invisível, pelas vozes vindas de todos os cantos da terra, pelas vozes que a agarram pelas entranhas, que exercem tanto mais poder sobre os seus nervos quanto mais se dedicam a falar a própria língua dos seus desejos, dos seus ódios, dos seus terrores. É verdade que às democracias parlamentares, mais excitadas, falta temperamento. As ditatoriais, essas, têm fogo no ventre. As democracias imperiais são democracias com cio.»

Georges Bernanos
in "Os grandes cemitérios sob a Lua", Edição «Livros do Brasil», Lisboa, 1988

Inteligência é preciso!!!

 


«...ilusão perigosa é a de crer que o advento da administração planetária é uma fatalidade histórica inevitável. A facilidade com que a pequena Honduras quebrou as pernas do gigante mundialista mostra que, ao menos por enquanto, o poder desse monstrengo se constitui apenas de um blefe publicitário monumental. É da natureza de todo blefe extrair sua substância vital da crença fictícia que consegue inocular em suas vítimas. Com grande frequência vejo liberais e conservadores repetindo os slogans mais estúpidos do globalismo, como por exemplo  o de que certos problemas - narcotráfico, pedofilia, etc. - não podem ser enfrentados em escala local, requerendo antes a intervenção de uma autoridade global. O contrasenso dessa afirmativa é tão patente que só um estado geral de sonsice hipnótica pode explicar que ela desfrute de alguma credibilidade. Aristóteles, Descartes e Leibniz ensinavam que, quando você tem um problema grande, a melhor maneira de resolvê-lo é subdividi-lo em unidades menores. A retórica globalista nada pode contra essa regra de método. Ampliar a escala de um problema jamais pode ser um bom meio de enfrentá-lo. A experiência de certas cidades americanas, que praticamente eliminaram a criminalidade de seus territórios usando apenas seus recursos locais, é a melhor prova de que, em vez de ampliar, é preciso diminuir a escala, subdividir o poder, e enfrentar os males na dimensão do contato direto e local em vez de deixar-se embriagar pela grandeza das ambições globais.

Que o globalismo é um processo revolucionário, não há como negar. E é o processo mais vasto e ambicioso de todos. Ele abrange a mutação radical não só das estruturas de poder, mas da sociedade, da educação, da moral, e até das reações mais íntimas da alma humana. É um projecto civilizacional completo e sua demanda de poder é a mais alta e voraz que já se viu. Tantos são os aspectos que o compõem, tal a multiplicidade de movimentos que ele abrange, que sua própria unidade escapa ao horizonte de visão de muitos liberais e conservadores, levando-os a tomar decisões desastradas e suicidas no momento mesmo que se esforçam para deter o avanço da "esquerda". A ideia do livre comércio, por exemplo, que é tão cara ao conservadorismo tradicional (e até a mim mesmo), tem sido usada como instrumento para destruir as soberanias nacionais e construir sobre as suas ruínas um onipotente Leviatã universal. Um princípio certo sempre pode ser usado da maneira errada. Se nos apegamos à letra do princípio, sem reparar nas ambiguidades estratégicas e geopolíticas envolvidas na sua aplicação, contribuímos para que a ideia criada para ser instrumento da liberdade se torne uma ferramenta para a construção da tirania».

Olavo de Carvalho («A Filosofia e seu Inverso»).

Qual a verdadeira face de Putin?

 

"Consideramos as tentativas para minar a legitimidade das Nações Unidas como algo extremamente perigoso. Isso poderia levar ao colapso de toda a arquitectura das relações internacionais e nada mais restaria senão a lei da força. Teríamos então um mundo dominado pelo egoísmo em vez do trabalho colectivo, um mundo caracterizado pela tirania e não pela igualdade. Não haveria democracia nem liberdade num mundo onde os diferentes estados seriam substituídos por um número crescente de protectorados e territórios externamente controlados" (discurso de Vladimir Putin nas Nações Unidas, 2015).


Pelo que podemos depreender, esta figura alinhava pela batuta globalista, o que, sem dúvida me deixa de pá atrás, e sabendo nós que a alta política é um jogo de espelhos, não ponho a mão no fogo por ninguém.

Alexandre Sarmento


segunda-feira, 11 de novembro de 2024

Conscientes e despertos...


Os donos do poder criam-nos inimigos e dirigem o nosso ódio para eles em várias frentes ao mesmo tempo.
Fomentam a ira, o ódio e o rancor para construir o caminho que levaremos até terem o seu objectivo completamente cumprido.
Somos portanto meros peões, meros objectos manipuláveis...
Como se pode evitar esta situação, perguntam?
Pensem pelas vossas cabeças, dispam-se de preconceitos, estejam verdadeiramente informados, procurem a verdade.
Sejam atentos e conscientes...

Alexandre Sarmento

Pintura "Narcissus" de Roberto Ferri. 





domingo, 10 de novembro de 2024

A tradição.

 

Tradição: para uma estirpe dotada da vontade de voltar a situar a ênfase no âmbito do sangue, é palavra brava e bela. Que a pessoa singular não viva somente no espaço. Que seja, pelo contrário parte de uma comunidade pela qual deve viver e, sucedida a circunstância, sacrificar-se, esta é uma convicção que cada homem com sentimento de responsabilidade possui e que postula à sua maneira particular com os seus meios particulares. A pessoa singular não se encontra, no entanto, ligada a uma comunidade superior unicamente no espaço, mas, de uma forma mais significativa, ainda que invisível, também no tempo. O sangue dos antepassados está latente, fundido com o seu, ele vive dentro de reinos e vínculos que eles criaram, custearam e defenderam. Criar, custear e defender: esta é a obra que ele recebe das mãos daqueles e que deve transmitir com dignidade. O homem do presente representa o ardente ponto de apoio interposto entre o homem do passado e o homem do futuro. A vida relampeja como o rastilho incendiado que corre ao largo da mecha que ata, unidas, as gerações…queima-as, certamente, mas mantém-nas enlaçadas entre si, do princípio ao fim. Em breve também o homem presente será igualmente um homem do passado mas, para conferir-lhe calma e segurança, permanecerá a ideia de que as suas acções e gestos não desaparecerão com ele mas antes constituirão o terreno sobre o qual os vindouros, os herdeiros, se refugiarão com as suas armas e instrumentos.


Isto transforma uma acção num gesto heróico que nunca pode ser absoluto nem completo como fim em si mesmo e que, pelo contrário, encontra-se articulado por meio de um conjunto dotado de sentido e orientação, dados pelos actos dos predecessores e apontando ao enigmático reino daqueles que ainda estão para vir. Obscuros são os dois lados e encontram-se mais para cá e mais para lá da acção, as suas raízes desaparecem na penumbra do passado, os seus frutos caem na terra dos herdeiros… a qual não poderá nunca vislumbrar quem actua e que é todavia nutrida e determinada por estas duas vertentes nas quais justamente se funda o seu esplendor intemporal e a sua sorte suprema. É isto que distingue o herói e o guerreiro face ao mercenário e ao aventureiro: e é o facto de que o herói extrai a sua força de reservas mais elevadas do que as que são meramente pessoais, e que a chama ardente da sua acção não corresponde ao clarão ébrio de um instante mas ao fogo cintilante que funde o futuro com o passado. Na grandeza do aventureiro há algo de carnal, uma irrupção selvagem, e em verdade não privada de beleza, em paisagens variadas… mas no herói cumpre-se aquilo que é fatalmente necessário, fatalmente condicionado: é o homem autenticamente moral e o seu significado não repousa unicamente em si mesmo, nem só no seu dia de hoje, mas é para todos e para todo o tempo.


Qualquer que seja o campo de batalha ou a posição perdida na qual se esteja, ali onde se conserva um passado e se deve combater por um futuro, não há acção que esteja perdida. A pessoa singular certamente pode andar perdida mas o seu destino, a sua sorte e a sua realização, valem em verdade como o crepúsculo que favorece um objectivo mais elevado e mais vasto. O homem privado de vínculos morre, e a sua obra morre com ele, porque a proporção dessa obra era medida só em relação a ele mesmo. O herói conhece o seu crepúsculo mas o seu crepúsculo assemelha-se àquele sangue vermelho do sol que promete uma manhã nova e mais bela. Assim devemos recordar também a Grande Guerra: como um crepúsculo ardente cujas cores já antecipam uma alvorada sumptuosa. Assim devemos pensar nos nossos amigos caídos e ver no seu crepúsculo o sinal da realização, o assentimento mais duro dirigido à própria vida. E devemos olhar longe, com um desprezo imundo, perante o juízo dos negociantes, daqueles que sustêm que “ tudo isto foi absolutamente inútil”, se queremos encontrar a nossa fortuna vivendo no espaço do destino e fluindo na corrente misteriosa do nosso sangue, se queremos actuar numa paisagem dotada de sentido e significado, e não vegetar no tempo e no espaço onde, nascendo, tenhamos chegado por casualidade.


Não: o nosso nascimento não deve ser uma casualidade para nós! Esse nascimento é o acto que nos radica no nosso reino terrestre, o qual, com milhares de vínculos simbólicos, determina o nosso posto no mundo.Com ele convertemo-nos em membros de uma nação, por meio de uma comunidade estreita de laços nativos. E daqui vamos depois ao encontro da vida, partindo de um ponto sólido, mas prosseguindo um movimento que teve início muito antes de nós e que muito depois de nós terá o seu fim. Nós percorremos apenas um fragmento desta avenida gigantesca, neste trecho, todavia, não devemos transportar apenas uma herança inteira mas devemos estar à altura de todas as exigências do tempo.


E agora, certas mentes abjectas, devastadas pela imundície das nossas cidades, surgem para dizer que o nosso nascimento é um jogo de azar, e que “poderíamos perfeitamente ter nascido franceses como alemães”. Certo, este argumento vale precisamente para quem assim pensa. Eles são homens da casualidade e do azar. É-lhes estranha a fortuna que reside no sentir-se nascido por necessidade no interior de um grande destino e de sentir as tensões e lutas desse destino como nossas, e com elas crescer ou inclusive perecer. Essas mentalidades sempre surgem quando a sorte adversa pesa sobre uma comunidade legitimada pelos vínculos do crescimento, e isto é típico delas. Reclama-se aqui a atenção sobre a recente e bastante apropriada inclinação do intelecto de insinuar-se parasitariamente e nocivamente na comunidade de sangue, e a nela falsear a essência em nome do raciocínio…isto é, através do conceito, à primeira vista correcto, de “comunidade de destino”. Da comunidade de destino, no entanto formaria também parte o negro que, surpreendido na Alemanha ao início da guerra, foi envolto no nosso caminho de sofrimento, nas senhas do pão racionado. Uma “comunidade de destino”, neste sentido, é constituída por passageiros de um barco a vapor que se afunda, muito diferentemente da comunidade de sangue: formada esta pelos homens de um navio de guerra que descende até ao fundo com a bandeira ondulando.


O homem nacional atribui valor ao facto de haver nascido entre confins bem definidos: nisto ele vê, antes de tudo, uma razão de orgulho. Quando acontece que trespasse esses confins, não sucede nunca que flua sem forma para além deles mas de modo a alargar com isso o seu espaço no futuro e no passado. A sua força reside no facto de possuir uma direcção, e portanto uma segurança instintiva, uma orientação de fundo que lhe é conferida em dote conjuntamente com o sangue e que não precisa das luminárias mutáveis e vacilantes de conceitos complicados. Assim a vida cresce numa maior unidade, e assim devém ela mesmo unidade, pois cada um dos seus instantes reingressa numa conexão dotada de sentido.


Claramente definido pelos seus confins, por rios sagrados, por férteis vales, por vastos mares: tal é o mundo no qual a vida de uma estirpe nacional se imprime no espaço. Fundada numa tradição e orientada para um futuro longínquo: assim se imprime ela no tempo. Ai daquele que corta as próprias raízes!..esse converter-se-á num homem inútil e num parasita. Negar o passado significa também renegar o futuro e desaparecer entre as ondas esquivas do presente.

Para o homem nacional, por outro lado, subsiste um perigo grande: o de esquecer-se do futuro. Possuir uma tradição comporta o dever de viver a tradição. A nação não é uma casa na qual cada geração, como se fosse um novo estrato de corais, deva acrescentar tão-somente um piso mais, ou onde, por meio de um espaço preestabelecido de uma vez por todas, não sirva outra coisa que continuar a existir, mal ou bem. Um castelo, um palácio burguês, dir-se-ão construídos de uma vez para sempre. Prontamente, todavia, uma nova geração, incentivada por novas necessidades, vê a obrigação de impor importantes modificações. Ou, por outro lado, a construção pode acabar por arder num incêndio, ou terminar destruída, e então um edifício renovado e transformado vem a ser construído sobre os antigos cimentos. Muda a fachada, cada pedra é substituída, e todavia, como se encontra ligada à raça, perdura um sentido do todo específico: a mesma realidade que foi num princípio. Talvez se possa dizer que somente durante o Renascimento ou na idade barroca tenha existido uma construção perfeita. Por acaso então se detinha uma linguagem de formas válida para todos os tempos? Não, mas aquilo que existia então permanece de algum modo oculto no que existe hoje.

Ernst Jünger,"Die Tradition."

Segredos da descolonização de Angola.

 


«Para Almeida Santos o documento de Mombaça "continha o essencial do texto, só formalmente não acabado, que viria a converter-se no acordo assinado na Cimeira do Alvor". Fora apenas submetido a um "simples ajustamento de forma". O papel dos negociadores nacionais tinha sido tão irrisório que até se poderia dizer que a "participação dos responsáveis políticos nas negociações do Alvor" tinha sido "uma participação chancelar": a delegação portuguesa limitara-se "a pôr em bom português o texto que de Angola veio". O Acordo tinha sido o que os líderes angolanos "quiseram que fosse" e a "pressa com que foi negociado" demonstrara "a urgência" que tinham "em se verem livres de nós". Tinha havido pouco tempo "para tudo fazer", o que "levou a que praticamente se não tivesse chegado a fazer nada". Gonçalves Ribeiro não considera que o texto do Alvor seja um mero decalque do Acordo de Mombaça porque (como as actas atestam) ao longo das reuniões "foi sendo sucessivamente ajustado às sensibilidades, percepções, vontades e credos de cada uma das partes".


(...) Os mais satisfeitos com o Acordo eram os militares portugueses em Angola: estavam orgulhosos do trabalho feito por Rosa Coutinho, para o qual auguravam, num futuro próximo, um papel proeminente em Portugal. As críticas ao Almirante, tanto por parte dos brancos como dos negros, estavam indubitavelmente ligadas ao favorecimento do MPLA, embora o diplomata [Tom Killoran] considerasse ser impossível a qualquer mortal cumprir aquela missão "sem ofender alguém". Rosa Coutinho rechaçara "as intenções golpistas que se tinham formado nas cabeças de meia dúzia de extremistas brancos", mas nem sempre respeitara os direitos dos próprios compatriotas: "Certamente terá violado os direitos civis de alguns brancos e poderia até vir a ser processado judicialmente por tê-lo feito, mas como era 'uma raposa velha' não se preocupava com tais minudências".

(...) O Acordo do Alvor tinha sido publicado (na íntegra ou parcialmente) pela Imprensa nacional e estrangeira, mas em 16 de Janeiro de 1975 o embaixador português nas Nações Unidas ainda não o tinha recebido: Veiga Simão solicitava que Lisboa lho enviasse urgentemente "a fim de ser imediatamente divulgado", senão acabaria por ser primeiro distribuído pelos representantes angolanos. Em Angola, as previsões mais cépticas ou os comentários menos alinhados com o triunfalismo ostentado pelas partes subscritoras do Acordo não eram bem-vindas. Os meios de comunicação eram uma poderosa arma de propaganda e (como a FNLA já adquirira um jornal) o governo de Rosa Coutinho impôs restrições à liberdade de informação. A decisão, justificada pela desejada paz social, era uma forma de silenciar opiniões divergentes da "linha justa". As transgressões consagradas na nova Lei de Imprensa incluíam a difamação do chefe de Estado, de ministros e diplomatas, a agressão ideológica a princípios democráticos legais ou ao processo de descolonização, violações ao Direito Civil e o incitamento à revolta popular ou à greve (que em Portugal viria a ser um direito constitucional). A coima mínima era de 200 contos e a mais pesada correspondia à suspensão do orgão noticioso por um período mínimo de 30 dias.




Durante uma conversa informal com Tom Killoran (antes de partir de Luanda), Rosa Coutinho disse-lhe que o Acordo do Alvor era "um acordo desajeitado", não crendo que "o espírito de cooperação entre os três Movimentos fosse muito sincero". Anos depois mantinha a opinião expressando-a através de uma típica metáfora gastronómica bem nacional: o Alvor tinha sido "uma 'caldeirada à portuguesa'", mas não se negasse o mérito de ter juntado os líderes angolanos à mesa com Portugal, de ter fixado a data da independência e de ter mantido Cabinda anexada a Angola. Para Mário Soares, a Cimeira assemelhou-se mais a um "jogo viciado". O ministro - que teve início pretensões de "cavalgar a questão africana", julgando que "poderia solucioná-la melhor do que os outros" - percebeu ao chegar à Penina que "os dados estavam lançados e o jogo praticamente feito". "A visão dominante naquela sala era pró-MPLA", diria. A leitura de Savimbi era semelhante: "As forças gonçalvistas" pretendiam "entregar o Poder exclusivamente ao MPLA" e Rosa Coutinho, que tinha sido "introduzido 'a martelo'" na Cimeira, como observador, não tinha parado "de manobrar nos corredores do hotel". Depois de se conhecerem as actas das reuniões pode aferir-se de que forma os ministros socialistas foram relegados para um lugar secundário nas conversações, como alegaram posteriormente. Almeida Santos referiu ter sido um mero escrivão e o MNE [ministro dos Negócios Estrangeiros] que ambos se limitaram a desempenhar um papel quase decorativo: "Tanto o Almeida Santos como eu estávamos um pouco à margem desses esquemas e a nossa contribuição na Cimeira, para dizer a verdade, foi mais do tipo 'chá e simpatia', limando algumas arestas mais vivas que já se desenhavam, claramente, entre eles". Para o fundador do PS, o Alvor foi "o compromisso possível", não crendo que houvesse outra estratégia que pudesse ser seguida: "Não tinha uma visão claro do que se poderia fazer de diferente e a minha capacidade de intervenção era reduzida. Não havia grandes saídas ou outras opções a tomar, com êxito".


(...) Rosa Coutinho, Mário Soares e Almeida Santos não acreditaram, logo após a assinatura do Acordo que este fosse posto em prática devido à direcção tricéfala do governo com um primeiro-ministro mensal. Mas como "vinha de Mombaça, tinha sido acordado por eles e não havia nada a fazer", justificou Pezarat Correia. Na verdade, o executivo angolano viria a revelar-se absolutamente disfuncional desde o início, mas o maior óbice à paz e ao cumprimento do Alvor foi a coexistência de três exércitos rivais, cuja manutenção foi permitida. Não foi imposta qualquer restrição ao poderio militar ou ao número de efectivos das tropas nacionalistas e essa lacuna contribuiu para o caos gerado em Luanda, quando nem 30 dias tinham decorrido sobre a assinatura do Acordo.

Para Melo Antunes, o "calcanhar de Aquiles" de Portugal foi a incapacidade de obrigar os líderes angolanos a cumprirem o Acordo. O Alvor não previa qualquer punição eficaz em caso de incumprimento pelos Movimentos e a única forma de o fazer respeitar seria recorrer à coacção pela força militar, o que era inevitável. Em Angola tinha começado a desmobilização dos soldados africanos das FAP e dos brancos recrutados na Província; o tempo de serviço das tropas fora reduzido e o Exército abdicou das Forças Auxiliares. Força militar era algo que Portugal já não tinha em Angola e também não poderia contar com eventuais reforços da Metrópole.


Havia ainda a intervenção em Angola das grandes potências mundiais (China incluída) que Lisboa não controlava, mas que para Melo Antunes poderia ter sido neutralizada, se as autoridades em Luanda tivessem meios para travar a corrida aos armamentos e as hordas estrangeiras (de zairenses, cubanos, russos) que dissimuladamente se foram infiltrando nos campos de treino disseminados pelo território. Como escreveu Savimbi: "A nenhum observador atento passava despercebido o desejo de supremacia que cada um dos ML procurava obter sobre os restantes. Daí a uma corrida ao armamento foi um abrir e fechar de olhos". Melo Antunes acreditava que, se Portugal tivesse sido capaz de obrigar à obediência do Alvor, "a influência das grandes potências pouco se poderia fazer sentir". Mas perante o "vazio de Poder da potência colonial", ficou dependente "da capacidade de os Movimentos levarem por diante a aplicação dos acordos e, portanto, dependentes apenas da sua boa-fé".

(...) O primeiro embaixador soviético em Portugal também não foi uma escolha casual. Formado na escola diplomática de Moscovo (o Instituto Estatal das Relações Internacionais) ainda na presidência de José Estaline, Arnold Kalinin desembarcou em Lisboa em 1974, proveniente de Havana, onde era conselheiro da Embaixada da URSS, desde 1969. Kalinin possuía no seu currículo duas competências muito recomendáveis à missão que lhe tinha sido destinada: falava "brilhantemente espanhol e português" e teve um papel relevante nos contactos entre militares do MFA e as Forças Armadas de Cuba, a partir do primeiro trimestre de 1975. Também não terá tido um contributo de somenos importância nos contactos que antecederam a intervenção cubana em Angola, onde foi embaixador da União Soviética a partir de 1983, um ano após deixar Lisboa. Falecido no início de 2012, Kalinin terminou a carreira diplomática em Havana, onde a iniciara. Como refere Vasco Vieira de Almeida: Ouvira falar "antes de ir para Angola de uma possível ajuda de cubanos ao MPLA. [...] Os intermediários estavam em Lisboa. Os primeiros contactos foram com o embaixador cubano que estava cá na altura...".


Para Pinheiro de Azevedo, "a descolonização, tal como se processou", só poderá ser entendida tendo em conta "as decisões dos grandes centros mundiais sobre África", embora Lisboa pudesse ter feito mais para se opor às ingerências directas de Moscovo e de Washington: "Portugal teria podido orientar a descolonização por forma a salvaguardar os seus interesses e antes de mais os interesses dos portugueses radicados em Angola e em Moçambique, se o povo português e os seus dirigentes tivessem reagido violentamente à entrega daquelas colónias a Movimentos comunistas. Não teria havido interferência das superpotências, apesar de estarem de acordo quanto a essa entrega. Mas essa reacção não foi possível porque as forças da Esquerda determinaram três factos fundamentais: primeiro, impediram a saída de soldados para as colónias, a partir de certa data depois do 25 de Abril; segundo, "lavaram o cérebro" e mentalizaram os que de facto partiram, de tal maneira que, em vez dos esplêndidos combatentes que tivemos de 1961 a 1974, seguiram para África transformados em cobardes; e terceiro, provocaram entre as nossas forças um ambiente de derrotismo e abandono tão pronunciado que não mais se pôde contar com elas, o que tornou impossível que negociações políticas diferentes fossem apoiadas pela força"».

Alexandra Marques («Segredos da Descolonização de Angola»).



sábado, 9 de novembro de 2024

Salazar, pungentemente profético!!!

 


Salazar bem sabia que o futuro não seria risonho, estava consciente dos vampiros e da luta pelo poder...
Um testemunho bem expressivo do sentimento do homem do leme!!!

«Lisboa, 12 de Dezembro [de 1965] - Encontro no regresso o chefe do governo um pouco constipado e rouco. Atribui tudo à secura do ambiente aquecido. Falo-lhe do Concílio, dos nossos bispos, dos progressistas, das impressões colhidas. Salazar concentra-se nos progressistas. Diz: "Eu não os compreendo. Eu não sei compreendê-los. Monsenhor Rotoli, da Nunciatura, tem razão quando diz que eu não tenho sensibilidade católica. Quer ele dizer que as minhas ideias não são a da maioria de hoje. É verdade. E no entanto nunca na história de Portugal alguém fez pela Igreja mais do que eu. Desde os tempos de D. Pedro I, e de João V, etc., fui eu quem mais tem protegido e ajudado a Igreja. Mas não me importo. Enquanto não se meterem comigo, não me importo".

(...) Lisboa, 5 de Dezembro [de 1967]- Salazar repete-me que se quer ir embora. Diz com ênfase: "não quero, repito que não quero morrer neste lugar. E também não quero viver muito tempo depois de sair, porque não quero ver as desgraças e a confusão em que o mundo vai mergulhar, e o país". Como eu disse que era melhor o destino resolver um problema que não está posto, Salazar ripostou: "Ah! mas vai estar! Porque eu vou levantá-lo com o Chefe do Estado. Mas os senhores, em lugar de estarem para aí com essas coisas, deviam era ajudar, e colaborar para todos juntos vermos a melhor maneira de se proceder à transição sem solavancos, e de modo a que não houvesse alteração nas coisas fundamentais". Depois, o chefe do governo retomou a sua preocupação com o progressismo: "Já não será no meu tempo, mas eu adivinho um choque brutal entre a Igreja e o poder civil. No dia em que o progressismo for anti-nacional - e caminha para isso! - o governo que aqui estiver não pode deixar de reagir. Note: já hoje o progressismo invade muita coisa. Nos ministérios já há muito progressismo. Daqui a pouco, temo-lo no governo, se é que já não o temos". Aludiu de seguida ao Cardeal Cerejeira: "Publicou para aí um livrinho, Na Hora do Diálogo. Pois bem: é tudo defensivo, é só para se defender, não teve a coragem de contra-atacar. É um fraco, sempre foi um fraco, nunca teve a coragem de castigar ninguém".

Franco Nogueira («Um Político Confessa-se - Diário: 1960-1968»).

Um pouco de verdade sobre o que hoje é o Estado de Israel.

 

JERUSALÉM NA BERRA
ESTAMOS EM PLENO CENTENÁRIO DA DECLARAÇÃO BALFOUR (2 de Novembro de 1917)

Este texto foi publicado em 2002, portanto, antes da invasão e ocupação do Iraque.
Foi quando o Iraque estendia as mãos à Europa e os USA-UK queriam impedir
A DECLARAÇÃO BALFOUR E O IRAQUE
No número da "Brotéria" de Novembro de 1938, fomos encontrar algum material bastante elucidativo. Fica na página 432 e refere-se à Declaração Balfour e fixação dos israelitas na Palestina.
Datada de 2 de Novembro de 1917, diz assim a Declaração:
«O Governo de Sua Majestade Britânica considera favoravelmente o estabelecimento na Palestina de uma sede nacional para o povo Judeu...etc...» ou na língua original:
«His MageUMA EVOCAÇÃO DA DECLARAÇÃO BALFOUR que aqui se transcreve a propósito da actual csty's Government views with favour the establishment in Palestine of a National Home for the Jewish people, and will use their best endeavours to facilitate de achievement of this object, IT BEING CLEARLY UNDERSTOOD THAT NOTHING SHALL BE DONE WHEREIN MAY PREJUDICE THE CIVIL AND RELIGIOUS RIGHTS OF EXISTING NON-JEWISH COMMUNITIES IN PALESTINE or the rights and political status enjoyed by the Jews in other country».
É como quem diz. Vamos juntar o fósforo a arder junto da palha, mas fica proibido atear fogo.
Foi tudo um acto altruísta da Grã-Bretanha, pelo Povo que ansiava há tantos séculos para regressar à origem, a chamada Terra Prometida?
Sabendo que os nativos que lá estavam há séculos se sentiriam naturalmente espoliados?
E descartaram-se à inglesa: A gente vai juntá-los, mas vocês têm de se dar muito bem. Ora parece que já sabiam muito bem o que esperar.
Às turras uns com os outros e o campo livre para os interesses britânicos...
Diz assim a Brotéria":
«Os que assim se surpreendem, ignoram que a Palestina constitui uma defesa natural do canal de Suez (*) e zona de apoio aos mais variados interesses britânicos no Próximo-Oriente; que fica o terminus da "pipe-line" do Iraque e do desejado caminho de ferro Haifa-Bagdad, a ligar em pouco tempo o Mediterrâneo ao Golfo Pérsico, concretizando assim o velho projecto de estabelecer mais estreito e rápido contacto com a Índia por via terrestre».
Já nesse tempo, em 1938...
e a respeito da questão do petróleo:
«Com efeito as grandes potências há muito se empenhavam... a posse das fontes de nafta era ... a primeira condição de vitória... e a mais... concessões de zonas de influência, ou a mesma ocupação territorial em que assentava as vias de comunicação...
... e não esqueçamos que, na Palestina, estão escalonadas algumas das paragens obrigatórias e pontos de defesa das vias marítima e aérea do Império Britânico, na linha de trânsito Europa-Índia-Austrália.
Em 1927, estabeleceu-se a carreira regular Inglaterra-Índia; foi disposto o aeroporto de Gaza, estação entre Cairo e Bagdad; Depois as carreiras da "Imperial Airways Ltd." começaram a atravessar a Palestina, rumo à Índia (**), duas vezes por semana...»
CONCLUSÃO
Já não é de agora. Os Ingleses sempre se consideraram donos do Próximo e Médio Oriente. Até ao Iraque pelo menos, uma vez que já não têm a Índia.
Agora em parceria com os Estados Unidos.
Parece que a instalação dos israelitas na Palestina, foi um meio. Não propriamente altruísmo... Foi o passo a dar para firmar o completo domínio britânico. Agora anglo-americano.
A Europa devia marcar presença (pacífica) no Iraque. Ouvir o Iraque. Aceitar o convite do Iraque que se abre à inspecção (***).
E pedir contas, pedir provas, às acusações anglo-americanas. E investigar as "provas" que eles apresentarem.
Onde termina a alegação?
Onde começa o pretexto?
O pretexto de readquirirem, por todos os meios, o completo domínio sobre as fontes de petróleo do Mundo.
Notas:

(*) O Canal Suez estava nesse tempo, sob o domínio britânico.
(**) - A carreira do Cairo para a Índia, fazia escala em Gaza e em Bagdad.
(***) - Refere-se às acusações anglo-americanas sobre a alegada "corrupção: petróleo-por-alimentos".

Pedro Torres de Castro

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

A chave da sobrevivência está nas nossas mãos.

 

«A expressão "simplicidade voluntária" foi popularizada nos Estados Unidos por Duane Elgin no seu livro publicado em 1981 Voluntary Simplicity; Elgin atribuia a paternidade do conceito a Richard Gregg, um adepto de Gandhi que havia escrito em 1936 um artigo com esse título. Da minha parte, escrevi uma primeira versão de La simplicité volontaire em 1985, no âmbito de uma colecção de livros sobre saúde; a minha reflexão sobre a saúde tinha-me levado à conclusão que nos países industrializados, a maior parte dos nossos problemas de saúde são derivados do sobre-consumo e que a nossa busca de saúde nos devia levar a um estilo de vida mais sóbrio, claramente contra a corrente. Dizia: A simplicidade não é a pobreza, é um despojar que nos deixa mais espaço para o espírito, para a consciência. É um estado de espírito que nos convida a apreciar, a saborear, a procurar a qualidade, é uma renúncia aos artefactos que pesam, incomodam e impedem de ir até ao fim das possibilidades". Voltei a escrever o meu livro numa reedição aumentada em 1998, desta vez insistindo nos efeitos sociais e ecológicos do nosso consumo excessivo: "Hoje em dia, dou-me conta que a via da simplicidade voluntária não constitui simplesmente o melhor caminho para a saúde, mas é sem dúvida a única esperança para o futuro da humanidade".»

«O maior perigo neste momento é a passividade. Apresentam-nos a mundialização como uma tendência inevitável, dizem-nos que depois do fracasso do socialismo, o capitalismo e a lei de mercado é a única via possível. Nada disto é verdade. Sem conhecer todas as soluções aos problemas sociais e ambientais com que nos deparamos, sem ter uma visão precisa do que será a sociedade ideal. Há certamente outras vias de acção que permitam o progresso para uma eco-sociedade, uma sociedade em que os humanos vivam em harmonia entre eles e a natureza. Em suma, trata-se de abolir a submissão à economia e criar uma sociedade que favoreça o bem-estar completo de todos os seus membros.»


«Claro, se nada for feito, e rapidamente, o momento de agir peremptoriamente vai chegar. Face às catástrofes os governos não terão escolha. Mas que tipo de sociedade será construída? Sociedades autoritárias com medidas restritivas impostas à maioria, mas decididas no topo, e podemos estar certos que estas beneficiarão os poderosos. A sociedade desigual arrisca de se tornar ainda mais mal concebida, com privilégios cada vez maiores para uma minoria.
Felizmente, no norte como no sul, mulheres e homens perceberam que globalmente estamos no caminho errado, que a via da mundialização que nos é apresentada como desejável e inegável leva-nos directamente à catástrofe. Perceberam também que já nada há a esperar dos governos, comprometidos e dominados pelo dinheiro. As nossas, assim chamadas, democracias ocidentais nada têm de democrático. Quando nos perguntaram antes de enviar soldados bombardear o Iraque ou o Kosovo? Antes que os alimentos geneticamente modificados terem invadido as prateleiras dos supermercados? Antes de mudar as regras do subsídio de desemprego? Antes de dar cabo do nosso sistema ferroviário? De facto, antes de tomarem todas estas decisões que afectam directamente as nossas vidas? Os que decidem por nós estão comprados pelas classes de capitalistas internacionais. A população aceita esta situação porque se deixa subverter pela forte máquina ideológica do capitalismo.»


«O decrescimento pode ter continuidade na vida pessoal de cada um através da escolha da simplicidade voluntária. Uma iniciativa individual que leva a acções colectivas.
Face aos problemas que afectam o nosso planeta, o decrescimento não é uma opção entre outras, é necessária. Não podemos impor um crescimento ilimitado a um planeta, a Terra, fechado e limitado. De facto, um tal crescimento assenta na utilização sempre maior dos recursos do planeta e gera resíduos cada vez mais abundantes; ora, neste momento, já ultrapassamos a capacidade de produção da Terra; consumimos o capital terrestre em vez de aproveitarmos os seus frutos; consumimos a capacidade da Terra de utilizar as suas multiplas substâncias químicas devido às invenções humanas, e para as quais a natureza não tem mecanismos suficientes de metabolização. Resultado: o equilíbrio do planeta tal como o conhecemos e tal como o necessitamos para a nossa sobrevivência está ameaçado a curto prazo. Vinte anos, cinquenta anos, cem anos até que os desastres batam à porta? A maioria vê esta ameaça muito longínqua, apesar de o seu modo de vida estar já, directa ou indirectamente, a ser afectado. E que são estes poucos anos na história da Terra, que data de milhões de anos, ou na história da humanidade, que conta centenas de milhares de anos? À escala de uma vida humana, a história da humanidade vive, talvez, os seus últimos segundos. E que fazemos face a esta perspectiva? Os que podem, consumem cada vez mais, os que não podem aspiram chegar lá o mais rapidamente possível. E os nossos governos puxam a maquina à sua capacidade máxima: “é preciso manter um crescimento contínuo para conseguir criar empregos e suportar o aumento constante do consumo”.»


«Como fazer estas mudanças? Não tenho a pretensão de conhecer A estratégia a adoptar que nos leve a essa sociedade desejável onde todas e todos possam viver convenientemente, em comunidades solidárias onde os seus filhos poderão, mais tarde, viver. Mas a minha longa experiência de militância, as minhas numerosas leituras e as minhas longas horas de reflexão levaram-me à estratégia que se segue. Acredito que por agora é necessário por em marcha acções em três frentes, que estão, aliás, intimamente ligadas:
1) Libertar-se do sistema: a cada um de tomar as medidas de forma a sair da cadeia de sobreconsumo-necessidade de ganhar muito dinheiro-stress e cansaço-passividade. A simplicidade voluntária é uma via que permite reencontrar tempo para viver e agir.
2) Unir-se para fazer mais com menos: desenvolvendo as nossas comunidades locais, damo-nos serviços que permitem viver melhor a menor custo e que responde melhor à totalidade das necessidades.
3) Criar organizações nacionais e internacionais eficazes que permitam que a nossa voz seja ouvida alto e bom som para impedir os governos de continuar esta via neoliberal. Não tenhamos ilusões, o capitalismo não cederá facilmente. Ao poder do dinheiro devemos opor-nos com poder dos números, da imaginação e da tenacidade.»


Serge Mongeau
in "Vers la simplicité volontaire".

Sempre contra a abominável ignorância!!!

 


«Essas modestas páginas culturais que sobrevivem, opinei, servem para não nos resignarmos. Para fazer com que, pelo menos, aos imbecis e aos ignorantes lhes sangre o nariz. Para nos recordar que ainda é possível pensar como gregos, lutar como troianos e morrer como romanos. Para aceitar, por fim, o ocaso de um mundo e o começo de outro no qual não estaremos; e fazê-lo serenos, jogando às cartas no salão cada vez mais inclinado do barco que se afunda, enquanto pelas escotilhas abertas, entre os gritos dos que pensavam ser possível escapar ao seu destino — "O barco era insubmergível", reclamam os imbecis —, soam os compassos da velha orquestra que nos justifica e nos consola.»

Arturo Pérez-Reverte 

Refutando o colectivismo socialista.

 


"O revezamento das gerações é inevitável. Conviria que ele fosse não só revezamento dos homens como, também, o do vocabulário e dos pontos de referência. A tradição a que estamos ligados é a da coragem, da lealdade, da fidelidade à palavra dada, da energia, da firmeza de carácter. O que estimamos e desejamos manter é, pois, uma certa imagem do homem. O que detestamos são as preocupações mercantis, a prioridade dada ao dinheiro pela nossa época, a estéril imagem puramente económica com que se nos apresenta a vida social, o anonimato e o tédio dos grandes formigueiros humanos, as nauseantes e vãs ideologias, as reivindicações mesquinhas e a pressão contínua e repugnante desta luta manhosa da existência colectiva. O que nós repudiamos é uma certa imagem da sociedade. A nossa escolha biológica é mais do que a defesa de uma raça; é muito mais vasta, é muito mais dramática. Sentimos profundamente a nossa condição animal, sentimo-nos profundamente mamíferos e obedecemos às leis não propriamente da nossa espécie mas do género a que pertencemos; estamos fundamente ligados a essas leis, queremos conservá-las; não queremos o formigueiro que nos constroem, não queremos a mutação para a colectividade de insectos superiores que o mundo moderno, colectivista ou liberal, nos prepara. Só desejamos regimes fortes pelo facto de eles imporem regras de salvação pública às forças de destruição e de escravização trazidas pelas modas científicas da produção; queremos que, para além da vida mecânica de escravos que nos reservam, por igual, a ideologia marxista e as normas da produção em série e em concorrência, haja um poder salvador, uma força suprema, que arbitre em favor da humanidade.
Estas perspectivas não são o resultado de uma meditação pessimista. Precisamente pelo contrário: é o facto de eu acreditar no futuro das ideias de que somos portadores que me leva a desejar que a sua apresentação se faça em termos de criar condições de diálogo. Saibamos aproveitar as lições do "blocus" eleitoral. E também dos modelos de que se servem os nossos adversários. “Conhecem o nosso programa?” — dizem os comunistas. E acrescentam: “Venham ver-nos. Nós conversaremos”. Procuremos, como eles fazem, as condições e o vocabulário da persuasão. Busquemos encarnar os interesses dos grupos sociais ameaçados ou incompreendidos; desenvolvamos ou criemos a solidariedade com o que existe; não sejamos mais apenas doutrinadores — porque a doutrina aborrece — nem nostálgicos — porque a nostalgia entorpece — mas procuremos lançar a âncora o mais possível na vida real, na vida local, na vida profissional, na vida sindical, para tecer desde já elos múltiplos e eficazes, pelos quais nos possamos tornar um dia a representação real de uma vaga de opinião pública."

Maurice Bardèche

quinta-feira, 7 de novembro de 2024

O regime dos pequeninos.

 


"Não sendo dominante o Evangelho de S. Marx, um outro recebe a adoração da generalidade dos habitantes do rectângulo. É o Evangelho democrático. Quem o não perfilha é excomungado e, mais ou menos, marginalizado. A democracia assumiu foros de religião. E não se pense que é uma religião que não faz uso do braço secular. Sem dúvida, proclama tal uso uma selvajaria, só própria de eras ainda não iluminadas pelo esplendor da nossa civilização — a civilização da bomba atómica. Porém o que ela diz é uma coisa, outra é o que faz. A democracia condena as fogueiras da Inquisição, mas aprova as fogueiras de Dresden, Hamburgo, Colónia, etc. Acha as cruzadas uma coisa indigna e um papa (democrata claro) pede desculpa pelas mesmas embora não tenha uma palavra de censura para o que o Sr. Eisenhower, inteiramente insuspeito na matéria, baptizou de Cruzade in Europe. E assim por diante. Escandalizam-se com a Gestapo, a Ovra, a Pide, e simultaneamente atribuem às suas polícias métodos e poderes semelhantes. Lembremos só num exemplo brevíssimo o que se passa no Iraque e em Guantánamo.
Em resumo a democracia berra contra a violência na altura exacta em que a emprega.
Claro que tomamos, aqui, democracia não como simples forma de governo mas como uma concepção axiológica. De resto uma e outra estão interligadas. O governo do povo pelo povo implica, obviamente, que os homens tenham liberdade de formar partidos e agrupamentos isto é, sejam dotados de liberdade de reunião. E, para formarem livremente os seus partidos ou agrupamentos, é indispensável que circulem sem obstáculos os ideais ou doutrinas, em volta dos quais aqueles se aglomerem — logo é indispensável a livre expressão do pensamento.
Qual o fundamento porém de tais liberdades? Obviamente, a imensa dignidade dos seus titulares, os homens, as pessoas humanas. Cada homem, cada pessoa humana será uma espécie de deusinho intangível e autónomo (claro que com excepção dumas pessoas humanas chamadas fascistas que, nem vale a pena discuti-lo, não têm obviamente a dignidade inerente a todas as pessoas humanas).
Torna-se patente que tais deusinhos não podem ser governados senão por si próprios e voltamos ao começo, à democracia enquanto regime."

António José de Brito

quarta-feira, 6 de novembro de 2024

Salazar, ainda vive.

 


«Dizer que Salazar foi um génio político será impolítico. Mas foi. É uma consolação da esquerda imaginar um provinciano manhoso, teimoso, cheio de sorte e obedecendo pura e simplesmente aos grandes deste mundo para conservar o poder. Eis um engano com o qual nada ganhamos. (...) É de repensar tudo acerca de Salazar. Num país atrasado, um grande conservador apoia-se fatalmente, embora não exclusivamente, em forças reaccionárias, mas os termos não são sinónimos. Melhor ainda: um conservador desses é em parte um reaccionário. Mas sabe evoluir, tem um plano capaz de digerir as modificações necessárias, de se limitar e enquadrar pelos princípios de sempre: Deus, Pátria, Família, Propriedade. Não quer voltar atrás ou sequer parar. Modela o novo pelo antigo, prudentemente.

(...) ao ser o único que reflectiu com certa largueza e ao mesmo tempo com realismo, sobre a questão do Estado, o pensamento político salazarista é o mais estruturado deste século em Portugal. É pena que assim seja, mas é verdade».

Manuel de Lucena («Portugal sem Salazar»).

Verdades modernas...

 


Muitos têm falado em nome da verdade, médicos, jornalistas, terroristas, advogados, taxistas, trotinetistas, políticos, pokémons, avatares, mas afinal qual é a verdade deles, qual verdade defendem?
Eu continuo a defender a verdade universal, a factual, a verdadeira, quanto às verdades manipuladas e com objectivos sobejamente conhecidos por parte de quem tenha dois dedos de testa, bem podem remetê-las para aquele local escuro e fedorento onde o sol não brilha, pois com verdades dessas,, quem precisa de mentiras!!!
A conclusão a retirar de tudo isto, é que se fabricam verdades à medida dos crentes, dos acólitos imbecilizados e ignorantes de A, B, C ou D, enfim, albarda-se o burro à vontade do dono, e ao que parece, os donos hoje são em número bastante limitado para tal quantidade de asininos!!!
Antigamente os burros serviam de meio de transporte de mercadorias, os burros de hoje apenas servem de meio de transporte da vontade de uma elite de trafulhas, demagogos, manipuladores e parasitas sociais. Enfim, dizem que evoluímos, ao que parece, este processo evolutivo está a transportar-nos para uma outra tão almejada condição, a dos invertebrados, rastejantes, babosos e acéfalos!!!
Como muitas vezes ouvi em terras de Barroso, "se vires burro, bota-lhe carga!"...
Irra que é demais, os burros já são tantos, que às vezes finjo-me de burro para não ser incomodado pelos que fingem ser inteligentes.


Quanto mais a sociedade se distancia da verdade, mais ela odeia aqueles que a revelam.

Frase pungentemente verdadeira de George Orwell.

E viva a manipulação, democraticamente manipulados, mas felizes!!!


Alexandre Sarmento 

terça-feira, 5 de novembro de 2024

Mostrando as garras...

 

Meus amigos, mais uma vez vou deixar aqui bem expresso, não me considero, nem de esquerda, nem de centro, nem de direita.
A única ideologia que sigo é a da minha consciência, sigo aquilo que sinto ser a linha mais humana, a mais adequada à situação.
Raramente faço juízos de valor e baseio a minha opinião normalmente em documentação ou relatos de fonte fidedigna.
Portanto não queiram fazer de mim aquilo que não sou, apenas devo obediência a mim próprio, tenho os meus princípios e sigo os meus princípios, se alguém houver que não se sinta bem com a minha opinião, é fácil ou contra-argumenta pacificamente baseado em factos ou informação verídica, ou então desampare-me a loja pois tenho muito em que perder o meu tempo.
Mentira e embuste não são mesmo a minha praia.
A verdade mesmo que inconveniente está acima de tudo, muito embora grande parte das vezes seja mais fácil ladear com a mentira, acreditar na falsidade, pois muitas vezes o problema mesmo é a preguiça mental ou a falta de curiosidade em ir mais além, esse é o verdadeiro mal, o ignorar, o aceitar tudo aquilo que nos enfiam pelos olhos dentro, ou seja deixarmo-nos influenciar ou mesmo formatar.
É preciso mesmo é que cada um comece a pensar por si e não siga o rebanho, pois um mau "pastor" poderá acabar por levar o rebanho a um suicídio colectivo..
Uma sociedade é certo que aje como um todo, mas se esse todo for mais culto, mais participativo, mais activo e especialmente mais humano, teremos decerto uma sociedade muito mais funcional, aprendamos com os erros do passado para que não voltemos a cometê-los de novo, será ao mesmo tempo uma grande perda de recursos e muito pouco dignificante, estúpido mesmo, digo eu!!!
Assim sendo cada um terá que assumir o seu papel, um papel activo, participativo, usar das suas capacidades, usar da sua inteligência, contribuindo para uma sociedade funcional e justa.

Alexandre Sarmento